Espanha: Alternativas Criativas a uma Economia em Crise

Este post faz parte da nossa cobertura especial Europa em Crise.

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Desde o início da crise económica, não tem sido possível à casta política tomar medidas que fomentem o crescimento ou que criem emprego. Pelo contrário, são aplicados múltiplos cortes aos orçamentos que põem em risco sectores inteiros da sociedade e que colocam em perigo os direitos sociais dos cidadãos. A situação agrava-se nos países cujas economias estão na corda bamba.

Face à situação actual, há quem decida tomar as rédeas do seu futuro. Em Espanha, continuam a surgir movimentos e fenómenos encorajadores: são muitos os que apostam na geração de alternativas viáveis seja através de redes de partilha de bens e serviços ou da criação de sistemas sustentáveis e de consumo responsável.

Partilhar para poupar

Uma das consequências da crise tem sido o alastramento da pobreza à classe média e o deterioramento das condições para os sectores mais vulneráveis da sociedade, tal como aponta um relatório recente das Nações Unidas sobre o caso espanhol. Enquanto isso, uma parte da população aposta em mecanismos de auto-gestão e de partilha e troca de bens como opções mais solidárias e económicas. Antes do início da crise, alguns destes mecanismos já existiam, porém é agora que estão a ganhar maior importância.

Para que viajar não se torne um luxo, e poder poupar dinheiro nas viagens, uma prática comum é a partilha de boleia. Dessa forma, pessoas que não se conhecem mas que pretendem fazer o mesmo trajecto, podem viajar juntas num só veículo por um preço razoável dado que dividem os gastos do combustível pelo número de passageiros. Seguindo o mesmo modelo, desenvolveu-se o táxi colectivo que consiste na divisão do custo do serviço pelo máximo número possível de pessoas. E também para quem viaja, o couch-surfing é uma alternativa que permite desfrutar de alojamento mais económico no estrangeiro.

Troca de livros em Móstoles (Madrid), 16 de Setembro de 2012. Foto de Fotogracción.

Troca de livros em Móstoles (Madrid), 16 de Setembro de 2012. Foto de Fotogracción.

A subida do IVA de 18 para 21 porcento em Espanha, medida que não estava incluída no programa eleitoral do actual Presidente Mariano Rajoy, implica um importante encarecimento e um duro golpe na carteira das pessoas. O aumento entrou em efeito em Setembro, mês em que os estudantes voltam à escola e as famílias compram materiais escolares.

Vários colectivos mobilizaram-se em força para coordenar doações de materiais didáctico, entre eles as assembleias de bairros e o movimento 15M. No que diz respeito a livros, sites como Libroscompartidos.com (Livros Partilhados) dedicam-se à troca de livros sem fins lucrativos inclusivamente a partir de cidades diferentes ao contar um serviço de envio e recolha do material.

Gerar um sistema responsável

As novas tecnologias, especialmente a internet, permitem expandir a onda de propostas construtivas bem como criar comunidades virtuais alternativas. É o que faz o site Etruekko, que paralelamente aos protestos e denúncias que tomam lugar em Espanha, pretende transmitir uma mensagem positiva e construir um modelo de sociedade diferente.

É uma rede social de comunidades virtuais, ainda em desenvolvimento, que potencia a responsabilidade social. Oferece o uso de uma moeda social chamada “truekko” que se obtém graças à troca de bens e serviços. Desta forma, consegue-se o empoderamento social, o consumo responsável e a difusão de princípios éticos através da web, mesmo para quem não seja um especialista no uso de novas tecnologias.

O blog Konsumo responsable (Consumo responsável) publicou a seguinte definição de “mercado social”:

El Mercado Social implementa un circuito de moneda complementaria que basa una parte de su funcionamiento en  bonificaciones aplicadas a los consumidores con cada compra, y que para el proveedor supone un descuento en la venta. Es algo parecido a los programas de puntos que tienen algunas empresas grandes para fidelizar clientes y aumentar ventas, pero con el objetivo de ampliar la incidencia de la economía solidaria y desarrollar redes amplias que puedan funcionar con una “moneda” basada en criterios económicos no capitalistas.

O Mercado Social implementa um circuito de moeda complementar que baseia o seu funcionamento em bonificações oferecidas aos consumidores com cada compra, e para o fornecedor pressupõe um desconto na venda. É algo semelhante aos programas de pontos que algumas grandes empresas usam para fidelizar clientes e aumentar as vendas, mas com o objectivo de ampliar a incidência da economia solidária e desenvolver redes amplas que possam funcionar com uma “moeda” baseada em critérios económicos não capitalistas.
Despejo do centro social Casablanca, 19 de Setembro de 2012 em Madrid. Os vizinhos saíram às ruas em protesto após a intervenção policial. Publicado no 15Mpedia

Despejo do centro social Casablanca, 19 de Setembro de 2012 em Madrid. Os vizinhos saíram às ruas em protesto após a intervenção policial. Publicado no 15Mpedia

Ocupações e centros sociais auto-geridos também têm um papel relevante nestas dinâmicas. Em Madrid, destacam-se La Tabacalera, Patio Maravillas e Casablanca. Estes centros nasceram da ocupação pacífica de um edifício devoluto para a criação posterior de espaços organizados e abertos ao público que oferecem actividades culturais e de recreio muito variadas.

Requerem organização constante por parte dos colectivos e associações que frequentam o centro e têm tido um impacto substancial nas comunidades em que se inserem. Para além das intervenções e debates sobre vários tópicos, os centros oferecem habitualmente também actividades como oficinas de dança e de música, concertos, exposições, lojas livres e espaços de encontro.

Horta urbana plantada na Puerta del Sol por membros do movimento dos indignados espanhóis em Maio de 2011. Foto de Lecamaleon (CC).

Horta urbana plantada na Puerta del Sol por membros do movimento dos indignados espanhóis em Maio de 2011. Foto de Lecamaleon (CC).

As hortas urbanas e hortas partilhadas [en], são propostas colectivas para práticas de horticultura em parcelas ou lotes sem uso nas grandes cidades. Favorecem sobretudo o encontro e intercâmbio entre pessoas dispostas a reflectir sobre o modelo económico a que pertencem e procurar alternativas éticas ao mercado vigente. Surgem daí grupos de consumo e cooperativas que permitem a compra de alimentos ecológicos renunciando ao mesmo tempo a conivência com os abusos contra pequenos agricultores cometidos pelas grandes cadeias de produção.

Independentemente de conseguir-se ou não criar um sistema capaz de competir com o mercado vigente, são cada vez mais as pessoas que aderem à auto-gestão, à ética e à responsabilidade social, questionando assim o mercado capitalista a partir da reflexão e da acção solidária. Isto deixa uma mensagem clara à sociedade e àqueles que estão no poder: um outro mundo é possível.

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