Brasil: Nova onda de discussões sobre o papel do “Ateísmo Militante”

Em 10 de outubro, o famoso teólogo da libertação, Frei Betto, escreveu um artigo no maior jornal do país,  Folha de São Paulo – reprodzido pelo Blog do Miro –  no qual ele comparou o “ateísmo militante” com a tortura.

A reação dos ateus chegou logo, expressando desapontamento com a “explícita demonstração de intolerância e preconceito vinda de uma das principais figuras do catolicismo progressista brasileiro”. O teólogo respondeu, explicando sua visão de “ateísmo militante”:

O que entendo por “ateísmo militante”? É o que se arvora no direito de apregoar que Jesus é um embuste ou Maomé um farsante. Qualquer um tem o direito de descrer em Deus e manifestar essa forma negativa de fé. Não o de desrespeitar a crença de cristãos, muçulmanos, judeus, indígenas ou ateus.

[…]

Ateísmo militante é, pois, profanar o templo vivo de Deus: o ser humano. É isso que praticam torturadores, opressores e inquisidores e pedófilos da Igreja Católica. Toda vez que um ser humano é seviciado e violentado em sua dignidade e direitos, o templo de Deus é profanado.

Sua declaração acabou por acrescentar mais combustível na polêmica. Daniel Sottomaior, presidente da Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (ATEA), respondeu ao “ataque” de Frei Betto no blog Sul21:

O raciocínio do religioso não resiste ao mais óbvio exame. Pode-se virá-lo de ponta-cabeça afirmando que todo indivíduo é um templo do humanismo secular, e que portanto os torturadores na verdade praticam religiosidade militante. Mais importante ainda é o fato de que rebatizar à plena força expressões já existentes para lhes dar significado espúrio e negativo é um inegável sintoma de preconceito.

[…]

Ideias não têm direitos nem dignidade: seres humanos têm. Ideias e crenças não precisam ser protegidas nem respeitadas. Seres humanos precisam. Essa parece ser a grande diferença moral entre ateus e religiosos: para nós só há imoralidade quando se causa sofrimento àqueles que podem senti-lo. As ideias que se virem. Para Betto e a maior parte dos religiosos, as ideias têm direito de não serem criticadas, mesmo quando falsas. Os humanos que se virem.

Imagem do usuário do Flickr vivoandando. Usado sob licença Creative Commons.

Robson Fernando, do blog Arauto da Consciência, cita vários casos, no Brasil, do que ele considera ser preconceito contra os ateus e o ateísmo (O Global Voices já escreveu antes sobre o preconceito expressado pelo apresentador de TV José Luis Datena).

Por outro lado, George Huxcley, do blog Graphephilia, questiona se o ateísmo é, ele próprio, uma religião:

O que me faz entender que apesar da negação de uma crença, seu fundamentalismo em querer fazer uma afirmação contrária a existência de deidades, é o mesmo agente motivador dos religiosos, em propagar sua crença, ou seja, a necessidade grande de ter suas questões resolvidas, a busca para um sentido existencial.

[…]

Claro concordo que por muito tempo os ateus foram discriminados socialmente, mas definitivamente não é usando da mesma moeda que conseguirão ter espaço e voz.

No mais eu tenho uma leve impressão que todos esses ateus proselitistas, em sua imensa maioria, são daqueles que dizem. ” – Sou Ateu Graças a Deus.”

"Jesus Vive" marca os pilares do que foi um abrigo e depois uma prisão política no rio de Janeiro. Imagem do usuário do Flickr swperman. Usado sob licença Creative Commons.

Finalmente, , Humberto Quaglio comenta em seu blog Um Deus em Minha garagem, que é impossível definir exatamente o  “ateísmo militante”, e que nós só podemos classificá-lo de acordo com a situação. ele também acrescenta:

Talvez a presença dos ateus na sociedade, que se torna a cada dia mais visível, principalmente por causa da internet, incomode aquelas pessoas que não estavam acostumadas a ver suas convicções confrontadas por quem tenha ideias diferentes. Esta desconfortável confrontação a suas crenças leva muita gente a esquecer que, em nossa sociedade, todos têm o direito de expressar suas convicções. Há quem pense que a mera discordância de uma crença religiosa, e a expressão pública desta discordância, é um desrespeito à religião. Isto demonstra certa imaturidade quanto à natureza de uma sociedade aberta, onde a crítica a uma ideia não é necessariamente uma agressão ou ofensa aos adeptos do ponto de vista criticado. O direito de “pregar o evangelho a toda criatura” vale para qualquer “evangelho” e para qualquer “criatura”.

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