Brasil: Revista dá chance de trabalho para moradores de rua

Você está certo por querer informações de outras fontes que não sejam os noticiários de tv ou os jornais de grande circulação. Na América Latina, Europa, Ásia, em todo o mundo tem sido assim desde a virada do século: as melhores notícias, as opiniões embasadas de verdade, os comentários mais pertinentes estão nos blogs e redes sociais, nas revistas de universitários e de ativistas.

A Revista Ocas é uma dessas publicações nas quais você encontra informações distintas da imprensa mainstream no Brasil. Mais do que isso. Sendo sigla de Organização Civil de Ação Social, a publicação é um trabalho voluntário inspirado em street papers [en] que existem mundo afora, especialmente a The Big Issue [en] que circula em Londres desde a década de 1990. O exemplo de criar oportunidades de trabalho para pessoas em risco social, os fundadores da Ocas persistiram em realizar no Brasil. E percebendo o potencial desses voluntários no país, a International Network Street Pappers [en] (INSP) apoiou a iniciativa de criar uma revista para ser comercializada por moradores de rua. Você leu certo, moradores de rua. E ela já circula nas ruas de São Paulo e Rio de Janeiro desde 2002.

Ocas #61. Ilustração de Alex Senna partilhada no Flickr (CC BY-NC-SA 2.0)

Ocas nº 61, lê-se em rodapé "invista em um ser humano". Ilustração de Alex Senna partilhada no Flickr (CC BY-NC-SA 2.0)

A equipe editorial explica:

O objetivo é fornecer instrumentos de resgate da autoestima dos vendedores, criando mecanismos para que o indivíduo se torne seu próprio agente de transformação, de forma que Ocas seja um ponto de passagem, e não o destino definitivo.

André Maleronka, participando da mobilização em prol da revista no blog Overmundo, acrescenta:

A revista, em papel jornal, conta com colaboradores de peso e uma mistura de notícias e resenhas culturais entremeadas com relatos de sem-teto, ex-moradores de rua, análise de políticas urbanas.

Um vídeo da organização explica como é a Revista Ocas para quem faz e quem vende:

A revista custa 4 Reais, 3 Reais vão diretamente para os vendedores e o 1 Real restante quem entrega para a Ocas é o próprio vendedor, numa relação de confiança que alguns deles não encontraram em outros empregadores. Marisa Suraci, vendedora da Ocas, desde o início com a revista, reencontrou sua vontade de trabalhar:

Eu pergunto aos empregadores que discriminação é essa no nosso país que não podemos trabalhar? Pessoas hoje portadores de cuidados especiais, ontem estudaram o quanto puderam e trabalharam todo o possível. A Ocas não é como os outros empregadores. Além dela ter me mantido financeiramente, eu mudei da água para o vinho no meu estado de saúde. Eu melhorava quando falava com alguém, quando vendia a revista, quando era bem recebida…

O blog Retinas Urbanas comenta a forma de arrecadação da Ocas e a relevância do projeto:

A única fonte de renda da OCAS é o valor pago pelos vendedores por cada exemplar da revista e eventuais anunciantes e doações, e eles ainda fazem Oficinas de Criação com pessoas de rua, quase sempre descobrindo um novo talento no desenho, no texto e até no cinema. Com a criação de vínculos dá para compreender as necessidades mais urgentes de cada um, como a falta de documentos ou tratamento para dependência química, e encaminhar uma saída pela rede de parceiros do terceiro setor.

As últimas edições tem sido publicadas sob dificuldades orçamentárias, e em São Paulo e Rio de Janeiro, as maiores cidades do Brasil, onde a revista circula, já se percebe a ausência dos vendedores. A edição mais recente – a 80ª – só pôde ser impressa através de um projeto de financiamento colaborativo no Catarse, que permitiu em 60 dias arrecadar R$ 8.880,00 em doações de 89 pessoas e entidades.

#ocas80: "Nove anos. 79 edições. 330 mil exemplares vendidos nas ruas. Centenas de pessoas beneficiadas"

#ocas80: "Nove anos. 79 edições. 330 mil exemplares vendidos nas ruas. Centenas de pessoas beneficiadas"

A revista tem um blog e uma página no Facebook, e procura voluntários e assinantes.

Está a circular uma petição online que reconhece a importância da revista e pretende garantir sua continuidade. Através dela, a Ocas adquire ainda mais legitimidade nos contatos com outras instituições, sem falar na alegria dos vendedores quando perceberem a quantidade de pessoas que passarão a reconhecê-los nas ruas. As capas estampam grandes personalidades do Brasil e do mundo, abordam assuntos com a responsabilidade de quem acredita em uma sociedade na qual a informação pode vir das mãos de todo cidadão.

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