Como uma disputa sobre pagamento da premiação quase impediu Camarões de jogar na Copa

Cameroonian national team captain Samuel Eto'o. Photo released under Creative Commons by  soccer.ru.

O capitão da seleção de Camarões Samuel Eto'o. Foto sob licença de Creative Commons, por soccer.ru.

A seleção de Camarões, os “Leões Indomáveis”, finalmente chegou ao Brasil, aproximadamente 24 horas após o programado. O time só veio depois de resolver um desentendimento de última hora sobre o pagamento da premiação, o qual ameaçou a participação do time na Copa do Mundo deste ano.

No domingo, dia 8 de junho, os Leões Indomáveis recusavam-se a sair do hotel se não recebessem a parte deles do dinheiro de premiação de Copa do Mundo [en] que a FIFA paga a cada país competidor. A FECAFOOT, a federação de futebol de Camarões, acabou atendendo [fr] às reivindicações dos jogadores, concedendo a cada um deles o adicional de 5 milhões e 800 mil Francos CFA (aproximadamente 12 mil dólares), em acréscimo aos 50 milhões Francos CFA (104 mil dólares) anteriormente prometidos pelo governo de Camarões.

A disputa sobre premiações é uma questão antiga. Desde os anos oitenta que ela vem atomentando a participação da seleção de Camarões em praticamente todos os torneios internacionais. Como colocou no Twitter Patrick Suffo, ex-jogador internacional de Camarões que participou da campanha da Copa de 2002, também marcada pelas brigas sobre gratificações:

Diferente era e os mesmos problemas antigos para a seleção de Camarões. Sem gratificação não tem viagem para o Brasil 2014

A revolta dos jogadores gerou debates passionais e polarizados, dentro e fora do país. Muitos argumentaram que os jogadores eram egoístas e não patrióticos. Bouba Kaélé, que se descreve como um fã de futebol, não tinha dúvidas a esse respeito:

Temos que concordar que a culpa é do governo que tolera a chantagem dos jogadores associada a uma tomada de refém permanente.

Um outro usuário, Peter Khoo, compartilha a mesma posição:

Os jogadores de Camarões deviam ter vergonha, ganhar 61 mil libras para jogar pelo seu país na Copa do Mundo não é suficiente para vocês?

Um artigo, publicado no jornal online NdjanguiPress, acusou [fr] os jogadores de “alta traição”, afirmando que:

Un joueur qui va à la Coupe du Monde est un soldat au front. S'il sait qu'il n'a pas de munitions pour le combat, ou qu'il est mal nourri, qu'il se déclare forfait avant d'embarquer. Ne pas mouiller le maillot sur fond des revendications est une haute trahison qui mérite sanction !

Um jogador que vai para Copa do Mundo é um soldado da linha de frente. Se ele sabe que não tem munição suficiente ou que está mal alimentado, deveria se retirar antes de partir para a batalha. Um jogador que não sua a camiseta, baseado em exigências [não razoáveis], merece ser punido.

Igualmente passionais são aqueles que acham que as reivindicações e ações dos jogadores eram justificáveis. @ankiecool, do Zimbábue, escreveu:

O tema sobre cartolas gananciosos foi repercutido num artigo [fr] no site Camerron-footbuzz, no qual se argumenta:

Dans la configuration actuelle, il nous apparaît plus juste que les footballeurs, principaux acteurs du football, bénéficient du fruit de leur labeur plutôt qu'il ne revienne aux médiocres qui gravitent autour de la sélection, vraisemblablement dans le but de s'engraisser…

Plutôt que de les vitupérer, ne devrait-on pas en être fiers ? Fiers de ces jeunes gens qui nous montrent la voie. Ces enfants qui, dans cette république particulière et répressive, n'ont pas manqué l'exceptionnelle opportunité de dire « STOP !!! »

Dentro da atual distribuição, parece justo que os jogadores, os principais atores dentro do futebol, se beneficiem dos frutos de seus trabalhos, em vez de indivíduos medíocres, que gravitam em torno da seleção com o objetivo de enriquecerem…
Em vez de puni-los, não deveríamos ser orgulhosos desses jogadores? Orgulhosos desses jovens que nos estão mostrando o caminho. Esses meninos que, nesta república peculiar e repressiva, não perderam a oportunidade única de dizer “Chega!!”.

Na mesma linha de pensamento, o blogueiro Ngimbis explicou [fr] o motivo de que, em Camoarões, o apelo ao patriotismo é sempre uma rua de mão única:

Pourquoi lorsqu’on parle de patriotisme, on en demande toujours plus aux sportifs, aux musiciens et autres artistes et non au fonctionnaire lambda ou au dirigeant x ? C’est simple : leur aura et leur talent ne sert qu’à cautionner le vol de hautes personnalités cachées dans l’ombre et qui les utilisent comme des marionnettes pour servir de caution à leur cupidité, leur avidité, leur malhonnêteté. Créateurs de richesses qu’ils ne mangent pas, voilà leur « devoir ».

Por que quando falamos de patriotismo, sempre exigimos mais dos atletas, músicos e outros artistas, do que dos servidores públicos comuns ou daqueles no poder? O motivo é simples: a aura e o talento desses atletas e artistas fornecem cobertura para aqueles do alto escalão do governo roubarem, vivendo nas sombras e os usando como marionetes para encobertar a culpa, a ganância e a desonestidade. A “obrigação” desses jogadores e artistas é a de serem gereadores de riqueza, mas sem participar dela.

O capitão da seleção, Samuel Eto'o, resumiu o debate com uma breve mensagem publicada [fr] em sua página no Facebook, enquanto o time finalmente se preparava para partir de Camarões:

Dommage pour ce beau pays qu'est le Cameroun, on a certains dirigeants amateurs quand même… mais malgré tout, nous gardons le sourire et surtout sommes fiers d'être Camerounais et de représenter notre pays dignement et valablement.

É lamentável que o nosso lindo país, Camarões, possua uns líderes tão amadores…Apesar de tudo, continuamos sorrindo, e temos muito orgulho de verdade de sermos camaroneses e de representar o nosso país de forma digna e genuína.

Tradução editada por Débora Medeiros como parte do projeto Global Voices Lingua

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