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Uma coruja sobe na árvore: Líder indígena resiste a invasão da polícia no Rio de Janeiro

Categorias: América Latina, Brasil, Ativismo Digital, Direitos Humanos, Etnia e Raça, Governança, Indígenas, Mídia Cidadã, Política, Protesto
Urutau resistiu por 26 horas em cima de árvore, em protesto a desocupação da Aldeia Maracanã. Foto: Facebook/ Mídia NINJA

Urutau resistiu por 26 horas em cima de árvore, em protesto a desocupação da Aldeia Maracanã. Foto: Facebook/ Mídia NINJA [1]

Na manhã de segunda-feira, 16 de dezembro, enquanto o batalhão da Tropa de Choque da Polícia Militar retirava a força [2] os ativistas que ocupavam um dos edifícios da Aldeia Maracanã, o líder da tribo Guajajara, José Urutau Guajajara correu. Aos 64 anos, Urutau – nome que em tupi significa coruja [3] – subiu em uma árvore como forma de protestar o despejo. E ali permaneceu por 26 horas.

No final da manhã de terça-feira, Urutau, foi retirado do local [4] pelos bombeiros e levado por uma ambulância. Diabético, o indígena teve seu acesso a água controlado pela polícia. Além disso, segundo informações do grupo Mídia NINJA, os policiais impediram [5] que qualquer comida chegasse a ele. Apoiadores da ocupação, que acompanhavam a resistência de Urutau, tentaram burlar o bloqueio [6] jogando alimentos. De acordo com o grupo de mídia independente ZUMBI [7], Urutau teria sido levado diretamente para a delegacia [8], ao invés de ser encaminhado ao hospital.

O indígena protestava exigindo a apresentação de uma ordem judicial que justificasse o despejo. Segundo informações do grupo Olhar Independente, a decisão judicial autorizando o despejo, apresentada pela polícia já era antiga e, portanto, não teria mais valor.  [9]Uma nota publicada no jornal Extra [10] confirmou a situação, revelando ainda que um policial não-identificado teria dito que as ordens era para que “não se expusessem” porque a ação era “na ilegalidade”.

Aldeia Resiste e insiste

A movimentação sobre a ocupação iniciada no último sábado e a luta de Urutau foram acompanhadas no Facebook [11] e no Twitter [12], com a hashtag #AldeiaResiste. Movimentos internacionais, como o espanhol Take the Square [13] e Occupy Wall Street [14], também manifestaram apoio aos brasileiros.

O complexo de 14 mil metros quadrados que forma a Aldeia Maracanã foi doado ao Serviço de Proteção ao Índio, em 1910. De 1953 a 1977, os prédios serviram como sede do Museu do Índio, porém, desde a transferência do museu ficaram abandonados. Em 2006, indígenas de 20 etnias [15] reocuparam novamente o local. 

Índios em um dos edifícios do complexo. Na parede, lê-se "Quer matar um povo? Então, roube-lhes a cultura". Foto: Facebook/Aldeia Maracanã

Índios em um dos edifícios do complexo. Na parede, lê-se “Quer matar um povo? Então, roube-lhes a cultura”. Foto: Facebook/Aldeia Maracanã [16]

Em agosto de 2012, o governo do estado e a prefeitura do Rio de Janeiro anunciaram que o local seria demolido para realização de obras da Copa do Mundo, já que fica próximo ao Estádio Mário Filho, o Maracanã.  Uma petição pedindo o reconhecimento de posse da Aldeia para os índios foi criada no Avaaz [17], explicando:

Neste local, indígenas de várias etnias vêm difundindo sua cultura há seis anos e em escolas particulares e públicas,exercendo direito garantido pela lei. Defendemos a criação de um centro de referência da cultura indígena.

Na época, representantes indígenas que brigam pelo espaço da Aldeia, apareceram em um vídeo explicando o caso:

O espaço foi ocupado quatro vezes em 2013, a primeira delas em março [18]. O decreto assinado pelo prefeito Eduardo Paes, em agosto, época da última ocupação, reconhece a presença da Aldeia Maracanã no local e determina o tombamento definitivo do prédio principal [19]– o que significa que não pode mais ser derrubado para as obras. No final de setembro [20], “o juiz da 7ª Vara da Fazenda Pública Federal assinou despacho impedindo a demolição” e determinando que, sem um pronunciamento do governo, a área deveria passar para os ocupantes, os indígenas.

Sem mais respostas para a situação, no sábado, ativistas voltaram a ocupar o local. Depois de uma tentativa de expulsão no domingo [21], na manhã de segunda-feira, 150 policiais [22] da tropa de choque, cumprindo ordens do governo estadual, cercaram o local e realizaram despejo [23] forçado dos ocupantes. Das 30 pessoas que estavam no prédio, 25 foram detidas, mas já estão em liberdade.

No final da terça-feira, depois de serem proibidos de voltar à Aldeia, Urutau e representantes do grupo despejado da Aldeia Maracanã, se juntaram a estudantes para ocupar a reitoria [24] da Universidade Estadual do Rio de Janeiro – UERJ. Eles pediam uma reunião para discutir o projeto do Museu do Índio [25]. O governador Sérgio Cabral e a construtora Odebrecht, responsável pelas obras, seguem sem se pronunciar sobre o assunto.