Angola: Polícia a Ferro e Fogo Contra Manifestação Por Eleições Justas

Sob o lema “Contra a Fraude nas Pŕoximas Eleições”, a cidade de Luanda foi palco de mais uma manifestação na manhã de 10 de março. E mais uma vez, segundo alguns relatos, o Estado fez sentir o seu braço pesado, reprimindo violentamente um direito que assiste a todos os cidadãos.

A manifestação convocada pretendia protestar contra os moldes em que as eleições previstas para 2012 estão a ser preparadas. Segundo a nota que acompanhava a chamada, a indicação pelo partido no poder, MPLA de uma sua militante, Suzana Inglês, para presidir a Comissão Nacional Eleitoral (CNE),  viola o artº 143 da Lei Orgânica das Eleições, aprovada em dezembro de 2011 por unanimidade, “tendo a oposição recorrido ao boicote abandonando em bloco a mesa das discussões, em protesto às imposições arrogantes do maioritário absoluto”.

Cartaz da manifestação de 10 de março

Cartaz da manifestação de 10 de março

O descontentamento com o governo do Presidente José Eduardo dos Santos, desde 1979 no poder, levou assim novamente às ruas o povo angolano, para reivindicar o critério de imparcialidade da dita lei, e a formação de um CNE independente do partido, mas também com uma reivindicação mais generalizada: “Angolanos Unidos contra a Corrupção. Zé Du fora!”

Foram recebidos com forte carga policial, conforme reportaram várias pessoas a partir do local, através do Facebook, Twitter e blogues.

Ao fim do dia, Nelson Pestana, jurista, cientista político e investigador e docente Universitário, resumiu numa nota de Facebook republicada pelo blog do Círculo Angola Intelectual, o que esperava os manifestantes na manhã de 10 de março, quando se concentraram no bairro do Cazenga, em Luanda:

O bando do mal já lá estava. A Polícia Nacional estava espalha pelo percurso anunciado, colocada como se estivesse emboscada. O lumpenato nacional contava pois com o apoio e a cumplicidade da Polícia Nacional que era suposto estar ali para manter a ordem pública, garantir a segurança dos manifestantes e fazer com que a Constituição da República fosse respeitada e não fosse pisoteada por um bando de mal-feitores. O que aconteceu não foi nada disto, como teria sido, num país civilizado. Os homens do mal começaram a agredir os manifestantes, de forma inusitadamente violenta, sem mais, nem menos. Traziam barras de ferro e armas de guerra.

O blogue Universal divulgou uma série de atualizações feitas a partir do lugar:

Luaty [Beirão, rapper conhecido como Brigadeiro Mata Frakuxz] tem a cabeça partida jorrando sangue e ainda se encontra em parte incerta; Luamba foi igualmente raptado; Explosivo Mental e Adolfo estão em situação complicada no local. Luaty Beirão foi ferido na cabeça e Mário Domingos foi levado pelos polícias. (…) Fernando Tomás, Amarildo Will Bento Tonet, Mário Domingos, organizador da manifestação voltou a desaparecer, um dos seus colegas está gravemente ferido. Segundo informações de jornalistas no local há disparos feitos pela polícia.

"Procuram-se: Agressores de Manifestantes". Imagem de Central 7311

"Procuram-se: Agressores de Manifestantes". Imagem de Central 7311

Nos dias anteriores, o governo tinha já posto em marcha o seu plano de acção. O rapper Carbono Casimiro, foi alvo de uma visita surpresa violenta, conforme se relata no blogue Central, que publicou também uma série de fotos dos agressores e das vítimas:

A casa tinha acabado de ser invadida por uma dezena de homens trajados de preto, armados com ferros e soqueiras metálicas, que arrombaram porta, janela do quarto e que deram início a um festim de pancadaria a todos os presentes: Sampaio Liberdade, Cavera C, Santeiro, Nelito e o próprio Carbono. Chegaram numa carrinha e colocaram-se dois matulões no portão de entrada que dá acesso às três outras residências para além da do Carbono, impedindo que alguém entrasse ou saísse. Estando o único acesso à casa fechado, os jovens viram-se encurralados e foram mais uma vez castigados por pensar diferente. (…) É incrível o nível de confiança que estes homens revelam, pois em plena luz do dia e mascarados apenas com chapéus e óculos escuros, fazem tudo aos olhos de todos. Os habitantes da rua do Carbono estavam todos aglomerados lá fora assistindo, um após outro, saírem lesionados e ensanguentados os agredidos. A polícia ainda recalcitrou, resistindo, tal como acontecera com o Mário Domingos, registar a queixa. Mas os jovens não arredaram pé e essa formalidade ficou cumprida.

A cidade de Benguela estava igualmente inserida na rota da liberdade de expressão para este dia 10 de Março, mas as forças policiais frustraram esta iniciativa conforme se lê no Club-K:

A manifestação era organizada por um grupo de jovens da cidade capital da província de Benguela e estava marcada para acontecer no principio da tarde deste sábado, e tinha o seu ponto de partida marcado para o jardim defronte a Escola 10 de Fevereiro, com culmino no jardim defronte ao mercado municipal ” mais conhecido como jardim milionário”; mas o executivo de Benguela proibiu o evento a pretexto de não obedecer a lei. Segundo alegava na nota entregue quinta-feira aos organizadores o percurso escolhido encontravam-se duas sedes de partidos políticos, “no caso o MPLA” .

Da intervenção policial em Benguela, resultou a prisão de membros da associação angolana de defesa dos direitos humanos OMUNGA, como é explicado no seu blog Quintas de Debate onde foram também publicadas fotografias das vítimas. A organização anuncia uma nova manifestação para o dia 17 de março, “para exigir a substituição de Suzana Inglês do cargo de presidente da CNE, mas também de solidariedade com todos os compatriotas reprimidos, humilhados, torturados, raptados, desacreditados e insultados pelo facto de quererem construir um País Democrático e para exigir o fim da repressão, proibição e restrição do exercício da liberdade de manifestação”.

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