Chile: Controvérsia Sobre A Proposta de Perdão da Igreja Católica

Como parte das comemorações do Bicentenário da República, a Igreja Católica chilena anunciou uma proposta [es] sobre a necessidade de perdoar certas pessoas condenadas por crimes por razões humanitárias [en]. Nas palavras do bispo Goic,

Nuestra petición no anula ni contradice el imperio de la Ley y la Justicia, sino que lo supone y lo exige. Es decir, velando por el imperio de la justicia -nada más injusto que la impunidad- y salvaguardando el pleno imperio de los derechos humanos en materia de crímenes de lesa humanidad, creemos que se pueden dar pasos de clemencia, actuando en el marco del estado de Derecho, del ordenamiento constitucional y de los tratados internacionales vigentes

Nosso pedido não contradiz o império da Lei e da Justiça, mas o pressupõe e o exige. Em outras palavras, zelando pelo império da justiça – nada é mais injusto que a impunidade – e salvaguardando o pleno império dos direitos humanos em matéria de crimes de lesa-humanidade, acreditamos que se podem dar passos [no caminho] da clemência, atuando dentro do marco do Estado de Direito, do ordenamento constitucional e dos tratados internacionais vigentes.

A proposta — anunciada em meio a controvérsia sobre as alegações de abuso sexual contra o padre Karadima [en] em Santiago — foi enviada ao Presidente Piñera para sua análise e eventual resposta afirmativa [en], causando grande controvérsia por todo o espectro político [en]. Em particular, a possibilidade de que esse perdão inclua os condenados por violações dos direitos humanos durante a ditadura de Augusto Pinochet.

O perdão é uma instituição legal antiga no Chile. Nas palavras do professor Marcelo Brunet [es]:

(…) el indulto presidencial es un resabio absolutista propia de las monarquías soberanas, una institución propensa a la arbitrariedad y los abusos de poder, que no se justifica en el siglo XXI.

O perdão presidencial é um absoluto vício das monarquias soberanas, uma instituição propensa à arbitrariedade e ao abuso de poder, que não se justifica no século XXI.

Em geral, a proposta foi aceita apenas em certos setores dos partidos políticos que fazem aprte da coalizão governista [es].

A Associação de Familiares de Detidos Desaparecidos se opôs fortemente à medida. Nas palavras [es] de Minerva García, vice presidente da organização:

La propuesta de la Iglesia no descarta sino que incluye, a pesar de que está señalado en forma bastante diplomática, pero cuando se habla de que hay que tener clemencia en crímenes en contra de la humanidad lo que se está diciendo es que los violadores de Derechos Humanos también son susceptibles de ser beneficiados con un indulto. Es una propuesta que claramente a nosotros nos provoca gran desazón.

A proposta da Igreja não descarta, mas inclui, apesar do que está sendo assinalado de forma bastante diplomática, mas quando se fala de que deve-se ter clemência em crimes contra a humanidade, o que está dizendo é que os violadores dos Direitos humanos também são suscetíveis  de serem beneficiados com um indulto. É uma proposta que claramente nos causa grande angústia.

Durante esta semana, a blogosfera chilena publicou uma série de interessantes artigos sobre a questão. Rodrigo Mora no Blog de la República [es] se opõe à proposta, argumentando que,

Sería inconveniente que Piñera sucumbiera a tamaño error de prudencia. El opinante y llanero solitario de los derechos humanos en la derecha podría cometer el peor de todos los errores: la vuelta de los fantasmas y la exhumación de varios cadáveres que ya parecían enterrados y que no estaban ni siquiera desaparecidos.

Seria inconveniente para Piñera sucumbir a tamanho erro de prudência. O opinativo e vigilante solitário dos Direitos humanos da direita poderia cometer o pior de todos os erros: A volta dos fantasmas e a exumação de vários cadáveres que já pareciam enterrados e que não estavam sequer desaparecidos.

Héctor Salazar, um advogado dos Direitos humanos, escreve para o El Quinto Pode [es] sobre a falta de ralacionamento entre as as celebrações pelo bicentenário do país e o perdão para aqueles que cometeram crimes:

Es indudable que un indulto general, decretado por ley, importa un sacrificio importante de justicia, y ello, dentro de un cuadro de impunidad creciente, mas que pacificar, crispa la convivencia social, obteniéndose así lo contrario de lo que sea dice desear: paz y tranquilidad.

Não há dúvida de que uma anistia geral, decretada pela lei, significa um sacrifício significativo da justiça, e isso, em um padrão de crescimento da impunidade, em vez de pacificar, perturba a vida social, conseguindo o oposto do que se diz querer: paz e tranquilidade.

O blogueiro Julio Suárez [es] também se opõe à proposta da Igreja, dizendo que ,

En Chile, los autores de delitos de lesa humanidad no han sido todos detenidos y procesados y encarcelados. Y muchos que sí lo han sido, recibieron penas leves. ¿Y ahora, indultarlos? El argumento es que son viejos. Sí, son asesinos que se pusieron viejos, no son “viejitos buenos”. ¿Se imaginan, con este argumento del “viejito enfermo”, estar hoy soltando a Paul Shäefer, por indulto?

No Chile, os autores de crimes de lesa humanidade não forma todos detidos e processados. E muitos que foram, receberam penas leves. E agora, os perdoar? O argumento é que [eles] são velhos. Sim, são assassinos que ficaram velhos, não são “bons velhinhos”. É possível imaginar que, com este argumento do ‘bom velhinho”, estar hoje soltando Paul Shäefer, por causa do perdão?

[Dentre] Aqueles que foram a favor da medida [estão] as associações de militares aposentados [es], que em uma declaração conjunta argumentaram que,

Expresamos asimismo, nuestra esperanza en que el actual Presidente de Chile, ajeno a indebidas como ofensivas presiones de quienes, interesadamente, insisten en perpetuar la odiosidad y división entre los chilenos, adopte la más sabia y justa resolución en esta trascendente materia que afecta el alma nacional, primando en él su condición del estadista que nuestro país requiere para enfrentar unitariamente su tercera centuria

Também expressamos nossa esperança de que o atual Presidente do Chile, afastado das impróprias e ofensivas pressões de quem, de forma interessada, insiste em perpetuar o ódio e a divisão entre os chilenos, adote a mais sábia e justa resolução para esta transcendente matéria que afeta a alma nacional, primando em sua condição de estadista  que precisa nosso país para enfrentar em unidade seu terceiro século.

No domingo, o Presidente Sebastián Piñera anunciou sua decisão final sobre a proposta, declarando que [es],

no es conveniente ni prudente, en los actuales tiempos y circunstancias, promover una nueva ley de indulto general.

Não é conveniente, nem prudente, nos atuais tempos e circunstâncias, promover uma nova lei de perdão geral.

No entanto, ele anunciou que iria usar sua capacidade de perdão presidencial de uma forma “muito prudente e restritivo” por razões humanitárias, deixando de lado os condenados por crimes graves, entre os quais ele incluiu direitos humanos, terrorismo, tráfico de drogas, estupro, homicídio e abuso de crianças. O anúncio presidencial foi apoiado [es] pelos diferentes partidos políticos chilenos. Carlos Moffat, no Blog de la República [es], reflete sobre isso:

Para una coalición que lleva muchos años haciendo de la seguridad ciudadana y de la puerta giratoria un tema de campaña política, un indulto general parecería una contradicción fundamental. Y para esa misma coalición, que debe – a pesar de mucho de sus miembros – demostrarle al país un compromiso más que retórico con la inviolabilidad de los derechos humanos, un indulto a los militares hubiera tenido un costo político significativo, sin ventajas aparentes.

Para uma coalizão que gasta muitos anos fazendo da segurança cidadã e da porta giratória um tema de campanha política, um perdão geral apreceria uma contradição fundamental. E para esta mesma coalizão, que deve – apesar de muitos de seus membros – demonstrar ao país um compromisso mais retórico com a inviolabilidade dos direitos humanos, um perdão aos militares teria tido um custo político significativo, sem vantagens aparentes.
Imagem miniatura pelo usuário do Flickr  adri021 e usado sob Creative Commons.

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