Colômbia: Mutirão humanitário recupera corpos de indígenas Awá

No dia 23 de março de 2009, um grupo com 470 indígenas colombianos, a maioria das regiões Central e Sudoeste, partiram [es] de El Diviso [es], uma cidade pequena (corregimiento) pertencente ao município Barbacoas [es] no departamento de Nariño. Era a ‘minga humanitária’ [mutirão típico em países da hispano-américa], uma missão que os indígenas levaram a cabo para resgatar os corpos de seus companheiros da tribo Awá, assassinados em fevereiro pelas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) (que por sua vez admitiram ter matado 8 indígenas, acusando-os de cooperar com o exército). Uma semana mais tarde, no dia 2 de abril, o grupo com cerca de 700 pessoas (incluindo alguns jornalistas da mídia doméstica, da alternativa e especialmente da estrangeira, o senador indígena Jesús Piñacué, e dois oficiais do Ministério Público [Defensoría del Pueblo]; e aproximadamente outras 300 que aderiram à marcha pelo percurso) voltaram a El Diviso, onde realizaram uma conferência pública. A minga conseguiu recuperar 8 corpos, entre eles, 5 do massacre de fevereiro.

A jornada

A Organização Nacional Indígena da Colômbia (ONIC), responsável por organizar a minga em parceria com a Unidade Indígena do Povoado Awá (UNIPA), publicou diariamente artigos sobre o mutirão em seu blog. No dia 25 de março, ela publicou [es] um relatório sobre a Assembléia Extraordinária das Autoridades Indígenas, realizada no final de semana anterior da minga, cuja discussão foi como [os Awá] acabaram ficando no meio do conflito armado interno colombiano:

En esta región del país donde habitan cerca de 15.000 indígenas Awá la disputa por el control territorial por parte de los actores armados legales e ilegales y algunas estructuras del narcotráfico en medio de las comunidades indígenas ha puesto en riesgo la integridad física, cultural y territorial de los indígena[s]. Para la Asamblea [Extraordinaria de Autoridades Indígenas] esta disputa: “ha vulnerado nuestros derechos y nuestra autonomía, desconociéndonos como sujetos políticos y de derechos y nos consideran como estorbos tanto para el régimen de derecha como de izquierda por el hecho de defender nuestra madre tierra, nuestra autonomía y cosmovisión propia, por nuestra posición integral, amplia, clara, transparente en la insistencia por defender la vida”.

Nesta região do país onde habitam cerca de 15.000 indígenas Awá, a disputa pelo controle territorial por parte do atores armados, legais e ilegais, e algumas estruturas do narcotráfico, no meio das comunidades indígenas, colocou em risco a integridade física, cultural e territorial dos indígena[s]. Para a Assembléia [Extraordinária das Autoridades Indígenas] esta disputa: “deixou vulneráveis os nossos direitos e a nossa autonomia, desconhecendo-nos como sujeitos políticos e de direitos e nos consideram como estorvos, tanto para o regime de direito, como o de esquerda, tudo por defender nossa terra mãe, nossa autonomia e cosmovisão prórpia, por nossa própria posição integral, ampla, clara, transparente na insistência para defender a vida”.

Também no dia 25 de março, a minga encontrou [es] uma cova com os corpos de Orlando Taicús (pai), James Taicús e Hugo Taicús (filhos), quem, de acordo com as autoridades indígenas e baseado na informação dada pela comunidade, foram assassinados pelas FARC em setembro de 2008. O relatório de uma comissão investigativa da minga [es], divulgado no dia 2 de abril, menciona que uma garota menor de idade da mesma família teve a perna amputada depois de ser acertada pelo tiro de um rifle. O resto da família (“três viúvas e quatro crianças órfãs”) fora retiradas do território. Na publicação do dia 27 de março, os indígenas alegaram ter encontrado membros das forças de segurança pública dentro do território Awá, e exigiram que todos os grupos armados cessarem fogo contra a minga.

No dia 29 de março, a minga chegou ao lugar onde o massacre de fevereiro provavelmente ocorreu, a remota reserva (resguardo) de Tortugaña Telembí, e encontrou [es] quatro cadáveres, dois homens (um tinha 15 anos de idade) e duas mulheres grávidas, ambas com menos de 25 anos. O artigo afirma também que uma comissão de peritos do Ministério Público chegou à selva, guiada e protegida pela guarda indígena. Às crianças que morreram ainda no útero de suas mães, foram dados os nomes póstumos de Ñambí e Telembí, e homenageadas [es] pela minga no caminho de volta.

No dia seguinte, um corpo sujo foi encontrado nas proximidades, junto a provas da presença de grupos armados, como Sergio Vargas, do jornal alternativo El Macarenazoo, escreve [es]:

En el octavo día de Minga, lunes 30 de marzo, se desplazó la última comisión a una vereda cercana de El Volteadero, loma arriba. Allí, se encontró la octava tumba, se hizo el registro pertinente, pero, además, se hallaron pruebas de la presencia guerrillera: Trincheras construidas en el subsuelo y galones con estopines, aparentemente utilizados como bombas que funcionan con el mismo mecanismo de las minas quiebra patas, incluso se hallaban banderas blancas justo encima de donde estaban construidas las trincheras.

En el paso que utilizamos cerca de cuatro veces para desplazarnos de El Volteadero a El Bravo encontramos una mina que estaba desactivada, pero que fue acordonada por la seguridad de los mingueros. Estaba tapada con tierra, pero la salida de dos cables dio cuenta de que estuvimos al borde de una tragedia, no queríamos venir con más muertos. En ese mismo paso, se encontraba, al lado de la trocha, un laboratorio de procesamiento de cocaína. Desde la primera hasta la última vez que lo vimos hubo cambios sustanciales; al principio un plástico transparente lo recubría, pero ya al final éste se había caído, y varias canecas en su interior habían sido movidas. La Minga tenía prohibido pisar este tipo de terrenos, por lo cual es ilógico pensar que un miembro de la comisión humanitaria pudiera haber generado estos cambios, además integrantes de la guardia indígena aseguraron haber visto en sus inmediaciones dos guerrilleros armados ingresando al laboratorio.

No oitavo dia da minga, segunda-feira, 30 de março, a última comissão se deslocou a um povoado próximo de El Volteadero, costa acima. Ali encontrou-se a oitava tumba, foi feito o registro pertinente, mas, além disso, foram encontradas provas da presença guerrilheira: trincheiras construídas no subsolo e galões com pavios, aparentemente utilizados como bombas, que funcionam com o mesmo mecanismo das minas terrestres; foram encontradas inclusive bandeiras brancas justo acima de onde estavam construídas as trincheiras.

No caminho que utilizamos uma quatro vezes para nos deslocar de El Volteadero a El Bravo, encontramos uma mina que estava desativada, mas foi fechada pela segurança dos participantes da minga. Esta tampada com terra, mas a ponta da fiação mostrou que estivemos perto de uma tragéria, não queríamos voltar com mais mortos. Nesse mesmo caminho encontrava-se, ao lado do acesso, um laboratório de processamento de cocaína. Desde a primeira até a última vez que o vimos teve mudanças substanciais; a princípio, um plástico trasparente o cobria, mas no final este já estava caído, e várias garrafas dentro dele tinham sido movidas. A Minga proibiu de pisar neste tipo de terreno, pelo qual é ilógico pensar que um membro da comissão humanitária pudesse ter gerado tais mudanças, além disso, integrantes da guarda indígena afirmaram ter visto dois guerrilheiros armados entrando no laboratório em seu arredores.

Vargas também ataca aos meios de comunicação em massa (chamando-os de “meios massivos de propaganda”) por terem “insultado a minga” ao alegar que os indígenas “estavam mortos de fome” e que o senador Piñacué foi uma das pessoas mais afetadas. Tudo por causa de dois helicópteros (um da Cruz Vermelha Colombiana e outro da agência de cooperação governamental da Ação Social) que tinham chegado à área carregando alimentos. De acordo com Vargas, a comida foi entregue ao povo indígena deslocado em El Diviso.

O relatório da comissão investigativa

Finalmente, a minga voltou para El Diviso e apresentou o relatório feito por uma comissão investigativa. Apesar de não ter encontrado todos os corpos (além dos 8 mortos assumidos pelas FARC, houve outros 3 assassinatos e mais 6 indígenas estão desaparecidos), a minga alegou que realizou [es] seu objetivo inicial, condenando as FARC “pela crueldade de decapitar, torturar, e assassinar nossos irmãos Awá”, incluindo duas mulheres grávidas e suas crianças, somando-se que as FARC estão cometendo crimes de guerra e crimes contra a humanidade. A minga também condenou outras forças armadas, assim como a guerrilha ELN, os esquadrões paramilitares, e Los Rastrojos — um bando narco-traficante —, “que abusam dos direitos humanos de nossas comunidades e fere a autonomia de nossas pessoas”. A comissão prosseguiu, dizendo que “qualquer ato de violência cometido por forças armadas, venham de onde for, serão condenados e denunciados por nossas organizações e [outras] organizações de direitos humanos”, demandando que os autores intelectuais e materiais do massacre sejam condenados. Também esclareceu que ao contrário do declarado por alguns meios de comunicação publicaram baseando-se nos relatórios do Exército, “não havia corpos” com minas terrestres sobre eles.

O relatório da comissão investigativa [es] dá detalhes do que a minga encontrou durante sua jornada de 10 dias:

En desarrollo del recorrido se logró llegar a la quebrada el Ojal, perteneciente a la comunidad el Bravo, encontrando allí, a las 12: 45 PM, el cuerpo sin vida de Omaira Arias Nastacuás, quien fuera brutalmente asesinada contando al momento de los hechos con 3 mese[s] de embarazo. Según los testimonios, este cuerpo padecía muestras de torturas practicadas por arma blanca.

(…)

En la misma avanzada en predios de la desembocadura de la quebrada el Ojal al rio Bravo se logró encontrar los cuerpos (sic) de Blanca Patricia Guanga Nastacuas con aproximadamente 18 años de edad, quien en el momento de los hechos contara con 7 meses de embarazo. Se evidenció que su vientre fue abierto con arma blanca, extrayéndole el bebe. No logrando encontrar el cuerpo del bebe.

Al lado se encontró el cadáver de Robinson Cuasalusan, quien padeciera las mismas formas de torturas. Dedos amputados y degollado su cuello.

No desenrolar [da minga] conseguimos chegar à desembocadura de Ojal, pertencente à comunidade de El Bravo, encontrando ali, às 12:45 PM, o corpo sem vida de Omaira Arias Nastacuás, quem foi brutalmente assassinada aos 3 meses de gravidez. Segundo testemunhas, o corpo tinha indícios de torturas praticadas por arma branca.

(…)

Na mesma investida, próximo à desembocadura de el Ojal com o rio Bravo, conseguimos encontrar os corpos (sic) de Blanca Patricia Guanga Nastacuas com aproximadamente 18 anos de idade, grávida de 7 meses. Ficou evidente que seu ventre foi aberto com uma arma branca, sacando o bebê. Não foi possível encontrar o corpo da criança.

Ao seu lado, foi encontrado o cadáver de Robinson Cuasalusan, quem sofreu as mesmas torturas. Dedos amputados e degolado pelo seu pescoço.

La comisión denuncia la orden que dio la FARC a los pobladores de no tocar ni dar información sobre los cuerpos ni sobre lo sucedido so pena de muerte.

Para esta comisión es de claro conocimiento que los argumentos que las FARC, presenten como actos justificatorios, es una farsa, pues las comunidades indígenas de Tortugaña, no son colaboradores ni sapos del Ejercito, por el contrario son comunidades que se encuentra aterrorizadas por los constantes combates que se han venido desarrollando en esa parte del territorio indígena Awá.

Por último esta comisión concluye, que antes de ocurrir los hechos el Ejercito Nacional si estuvo, en las viviendas de las víctimas instando a los comuneros participar en su lucha contra la insurgencia.

Expuestas las anteriores consideraciones, queda claro que por un lado el territorio Awá de Tortugaña es un cementerio colectivo y que es la Minga Humanitaria la que logra destapar ese escenario de impunidad que se venía gestando en este territorio por causa del temor de sus pobladores.

A comissão denuncia a ordem dada pelas Farc para que os moradores para não tocar e nem dar informações sobre os corpos e sobre o que aconteceu sob pena de morte.

Para esta comissão, é de claro conhecimento que os argumentos das FARC, apresentados como atos justificatórios, são uma farsa, porque as comunidades indígenas de Tortugaña não são colaboradoras do Exército nem informantes, pelo contrário, são comunidades que estão aterrorizadas pelas constantes batalhas que têm se desenvolvidao em parte do território indígena Awá.

Finalmente, o comitê concluiu que, antes de acontecerem os feitos, o Exército Nacional esteve, sim, nas casas das vítimas para instar a comunidade a participar na sua luta contra a insurgência.

Expostas as declarações acima, fica vidente que por um do lado o território Awá de Tortugaña é um cemitério coletivo e que a Minga Humanitária é quem consegue trazer à tona este cenário de impunidade gestado no território por causa do medo de seus moradores.

A minga alega ter conseguido fazer o que algumas instituições do Estado não conseguiram, tornando evidente que “muitos dos argumentos oficiais do governo são falsos e faltavam com a verdade política e desejo moral para resgatar os corpos e intervir nos problemas sociais do povo Awá”.

De acordo com a nota de imprensa [es] do Ministério Público, três dos corpos encontrados foram movidos pela comissão de peritos do Ministério Público para o porto de Tumaco, enquanto as coordenadas dos cinco restantes foram gravadas por oficiais para que o time de peritos técnicos do Procurador Geral desenterrem os cadáveres.

Caruri concorda [es] com as conclusões da minga a respeito do governo:

En dos meses las autoridades colombianas no fueron capaces —ni tuveron siquiera la intención— de buscar esos muertos. Porque no eran suyos, no eran “de los suyos”, no eran importantes, no generaban retribuciones políticas, no daban votos.
Qué lástima. Qué vergüenza!

Em dois meses as autoridades colombianas não foram capazes – nem tiveram sequer a intenção – de buscar esses mortos. Porque não eram seus, não eram “dos seus”, não eram importante, não geravam retribuições políticas, não davam votos.
Que pena. Que vergonha!

No domingo, a ONIC relatou e denunciou [es] a morte de Hermes Nastacuás, outro indígena Awá que pisou em uma mina terrestre colocada pelas FARC. Seus três filhos pequenos, que estavam andando com ele, ficaram feridos. As minas terrestres ficam na mesma área que a minga humanitária esteve dias antes. Esta notícia do crime ecoou pela agência de notícias EFE [es] e outros meios de comunicação locais.

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